Celebrada nesta quinta-feira (19), a solenidade de Corpus Christi é, segundo o padre Nilson Maróstica, SJ, “o coração pulsante da fé cristã”. Em entrevista à Rádio Amar e Servir, o jesuíta, pároco da Paróquia São Luís Gonzaga em São Paulo, refletiu sobre o sentido profundo da Eucaristia à luz da espiritualidade inaciana. Para ele, “a Eucaristia é o que alimenta a missão” e se torna fonte de discernimento, serviço e transformação do mundo.
Inácio de Loyola e a força da Eucaristia
A Eucaristia ocupava um lugar central na vida de Santo Inácio de Loyola. Padre Nilson recorda que o fundador da Companhia de Jesus desejava celebrar sua primeira missa em Jerusalém, mas, impedido, a realizou na Basílica de Santa Maria Maior, em Roma. “Era como se estivesse na Terra de Jesus”, comenta.
Além do aspecto simbólico, Inácio recorria à Eucaristia para confirmar decisões importantes, como na redação das Constituições da Companhia. “Era no altar que ele buscava a confirmação da graça de Deus”, afirma padre Nilson.
Celebrar, discernir, servir: a mística eucarística inaciana
Na espiritualidade inaciana, a Eucaristia não é apenas celebrada; é vivida. Ela se torna prática de discernimento, busca de Deus em todas as coisas e serviço ao próximo. “A Eucaristia fortalece a capacidade do discernimento e motiva a ação”, explica o jesuíta. Mesmo quando a comunhão sacramental não é possível, Inácio recomendava a comunhão espiritual como expressão de fé e desejo de união com Cristo.
A resposta ao individualismo: comunhão e solidariedade
Num tempo marcado pelo individualismo, pela fragmentação e pelo cansaço interior, a Eucaristia aparece como antídoto. “A Eucaristia é comunhão com o corpo de Cristo e com os irmãos”, destaca padre Nilson. Ao contrário da cultura do “eu”, ela promove uma cultura de solidariedade, partilha e corresponsabilidade.
“A celebração eucarística pode ser um momento de reflexão sobre o impacto do individualismo em nossas vidas e de busca por alternativas que valorizem o bem comum”, acrescenta.

Padre Nilson Marostica, SJ/ Foto: arquivo pessoal
"Em tudo amar e servir": a lógica do dom
O lema inaciano “em tudo amar e servir” encontra sua origem e inspiração na Eucaristia, que é o sacramento do amor gratuito e do serviço. “O amor recebido na Eucaristia se traduz em ações concretas de serviço”, resume o padre.
Assim, a espiritualidade eucarística convida os cristãos a viverem uma fé que se expressa nas relações cotidianas, na reconciliação, na gratuidade e na generosidade: “A Eucaristia é modelo do amor que se doa”, diz o padre Nilson.
Eucaristia e missão: um compromisso com a justiça e a criação
Ao final da entrevista, padre Nilson relaciona a vivência eucarística com os grandes desafios da atualidade, como as feridas sociais, a crise ecológica e a construção de uma Igreja sinodal. “Cultivar uma espiritualidade eucarística que seja política, ecológica e social requer um compromisso profundo com a escuta, o discernimento em comunidade e a ação transformadora”, afirma.
Inspirada pelas Preferências Apostólicas Universais da Companhia de Jesus, essa espiritualidade leva a reconhecer Cristo nos pobres, na criação e nas estruturas sociais. “Testemunhar a fé com coerência e ousadia” é, segundo o padre, a resposta para viver uma Igreja em saída.
Corpus Christi: ponto de partida para amar e servir
A celebração de Corpus Christi, como recorda padre Nilson, é mais do que um rito solene. É um convite a fazer da Eucaristia o centro da vida cristã. “Celebrar Corpus Christi é deixar-se tocar pelo amor que se doa, pelo Cristo que se faz pão e caminha conosco”, conclui.