"Sofrimento não se mede, não se compara, não se elimina. Ele precisa ser acolhido e cuidado", afirma psicóloga
Profissional destaca sinais de alerta, importância do acolhimento e necessidade de políticas públicas efetivas para prevenção do suicídio e cuidado em saúde mental.
Por Ronnaldh Oliveira
Publicado em 16/09/2025 19:56 • Atualizado 16/09/2025 20:06
Sociedade e mundo
Foto: Banco de Imagens Canva Pró

A vida é um dom precioso que deve ser promovido e cuidado, especialmente quando está fragilizada. No mundo, mais de 720 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos, de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre jovens de 15 a 29 anos, o suicídio é a terceira principal causa de morte, configurando-se como um grave problema de saúde pública que demanda atenção urgente.

Para falar sobre prevenção, sinais de alerta e a importância de uma rede de apoio, a Rádio Amar e Servir conversou com Daniele Souza, psicóloga que integra a equipe do projeto Cuidar da Vida, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Durante o último ano, Daniele percorreu diversas regiões do país oferecendo formação para o acompanhamento de adolescentes e jovens com ideação suicida.

Segundo a especialista, apesar de avanços na visibilidade do tema, ainda existe um grande desafio na estruturação de políticas públicas eficazes.

“Ainda é um cenário muito frágil. Muitas intervenções são superficiais ou não oferecem o suporte necessário. O suicídio é um fenômeno complexo e multifatorial, que envolve fatores psicológicos, sociais, culturais e familiares”, explica Daniele.

Ela aponta que questões como uso inadequado do ambiente digital, isolamento social, vulnerabilidade socioeconômica e a fragilidade das relações pessoais têm impacto direto na saúde mental de adolescentes e jovens.

“Quando não há vínculos verdadeiros ou uma sensação de pertencimento, o jovem pode se sentir desvalorizado e isolado, o que aumenta o risco de desesperança e desânimo”, acrescenta.

Sinais de alerta

O suicídio, de acordo com Daniele, raramente acontece de forma repentina. Ele é resultado de um processo de intenso sofrimento emocional que pode ser percebido através de mudanças no comportamento.

Entre os sinais que merecem atenção estão:

  • perda de interesse por atividades que antes eram prazerosas,

  • mudanças bruscas no sono ou na alimentação,

  • descuido com a aparência,

  • irritabilidade frequente,

  • aumento do consumo de álcool,

  • e falas com conotação de despedida ou desesperança.

Nas redes sociais, postagens de autodepreciação, desvalorização ou conteúdos relacionados à morte também devem ser encaradas como um pedido de ajuda.

“Nunca podemos tratar essas manifestações como ‘drama’ ou ‘chamar atenção’. Sofrimento não se mede, não se compara, não se escolhe eliminar. Sofrimento se acolhe, se escuta e se cuida”, reforça Daniele.

Daniele ofereceu capacitação para várias lideranças ao redor do Brasil, abarcando a temática do acompanahmento de adolescentes e jovens com ideação suicída/foto: arquivo pessoal

Como oferecer ajuda

Abordar alguém em sofrimento requer empatia e sensibilidade. A psicóloga orienta que familiares, amigos e comunidades se aproximem sem julgamentos e com disposição para ouvir.

“É como adentrar um solo sagrado. O primeiro passo é escutar, com ternura e paciência, sem dar respostas prontas ou reações de espanto. Mostrar-se disponível e identificar juntos uma rede de apoio é fundamental”, explica.

Daniele destaca que a busca por acompanhamento profissional deve ser estimulada sempre que o sofrimento estiver impactando a rotina ou se prolongando. Em casos de ideação suicida ou planos concretos, a procura por ajuda especializada deve ser imediata, através de serviços como as Unidades Básicas de Saúde (UBS), Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) ou pelo CVV – Centro de Valorização da Vida, que atende gratuitamente pelo número 188.

Campanhas e políticas públicas

Neste mês, a campanha Setembro Amarelo foi oficializada por lei no Brasil, incluindo o Dia Nacional de Prevenção do Suicídio (10 de setembro) e o Dia Nacional de Prevenção da Automutilação (17 de setembro).

Para Daniele, essas iniciativas são essenciais, mas ainda há muito a ser feito:

“As campanhas dão visibilidade e reforçam a importância da prevenção. Mas é preciso garantir o acesso aos serviços de saúde mental, ampliar a rede psicossocial, capacitar profissionais e chegar aos jovens em seus ambientes de convivência, como escolas e comunidades”, defende.

Ela reforça que o cuidado precisa ser uma responsabilidade compartilhada entre governo e sociedade:

“Ao poder público, cabe olhar para esse problema como questão de saúde pública. À sociedade, cabe também se comprometer e cuidar do seu entorno, cobrando direitos e oferecendo um cuidado sensível e amoroso.”

Serviço

  • CVV – Centro de Valorização da Vida: 188 (ligação gratuita)

  • Atendimento online: www.cvv.org.br

  • Unidades Básicas de Saúde (UBS) e CAPS: atendimento gratuito em saúde mental

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