"A COP30 não pode ser apenas um evento, mas um ponto de virada", afirma padre Sílvio Marques, SJ
À frente do Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental, jesuíta amazônida detalha a articulação local, nacional e internacional da Companhia de Jesus para levar propostas concretas à conferência climática em Belém
Por Redação Rádio Amar e Servir
Publicado em 14/08/2025 15:58
COP 30

A COP30, marcada para novembro de 2025 em Belém, será mais do que uma conferência sobre mudanças climáticas. Para o padre Sílvio Marques Souza Santos, SJ, amazônida de Marabá (PA) e diretor do Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (SARES), trata-se de um chamado urgente para decisões concretas que reconheçam a Amazônia e seus povos como sujeitos de direito. “Meu sonho para a COP30 é que ela não seja apenas um evento, mas um ponto de virada”, afirma.

Em entrevista à Rádio Amar e Servir, o jesuíta — doutor em Ciências Ambientais e Sustentabilidade pela Universidade Federal do Amazonas — detalhou como o SARES e a Companhia de Jesus têm se preparado institucionalmente para contribuir com a conferência. A estratégia, segundo ele, envolve três eixos principais: articulação em rede, incidência política e network internacional.

No campo da articulação, o SARES integra a estratégia da Província dos Jesuítas do Brasil e da Conferência dos Provinciais Jesuítas da América Latina e Caribe (CEPAL), participando do comitê da COP30 do Tapiri Comínico. Essa presença, afirma, permite “compartilhar experiências locais e projetos da Amazônia em fóruns internacionais”.

Na incidência política, a obra jesuíta está presente em espaços como a Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM) e a Conferência Eclesial da Amazônia (CEAMA), além de participar ativamente da Cúpula dos Povos, evento paralelo à COP30 na Universidade Federal do Pará. Já no network internacional, o SARES se conecta a centros jesuítas ao redor do mundo, como o Global Ignatian Advocacy Network (GIAN) e o Loyola Social Energy Center, na Índia, atuando especialmente no grupo de financiamento climático e transição energética.

Preferências apostólicas na prática amazônica

Padre Sílvio explica que as três prioridades definidas pela Companhia de Jesus para a COP30 — cancelamento da dívida dos países em desenvolvimento, transição energética justa e soberania alimentar baseada na agroecologia — se materializam em projetos concretos na Amazônia. Entre eles, destaca o apoio a campanhas de conversão de dívidas estaduais em investimentos climáticos, a implantação de energia solar comunitária em comunidades ribeirinhas e indígenas, e a promoção da agroecologia indígena como resistência ao avanço do agronegócio.

O SARES, diz, também se posiciona contra “falsas soluções” como hidrelétricas predatórias e denuncia o racismo ambiental presente no modelo energético vigente. “A igreja deve ser profética, denunciando o extrativismo e anunciando alternativas”, reforça.

Sementes locais para debates globais

Projetos como Aprendizagem para Ecologia Integral, Ajure e parcerias acadêmicas com a UFAM são, para o jesuíta, “sementes para os debates globais”. Eles articulam formação comunitária, cadeias produtivas sustentáveis (como a do açaí e da castanha) e produção científica com comunidades tradicionais para fundamentar propostas em temas como financiamento climático e ecologia integral.

Vozes da Amazônia na COP30

A presença ativa de povos originários e comunidades tradicionais é, segundo padre Sílvio, central no método de trabalho do SARES, inspirado na “escuta sinodal como método”. A organização apoia diretamente a participação de lideranças indígenas e jovens na conferência, articulando posicionamentos conjuntos e cartas de reivindicação.

Para o jesuíta, que cresceu à beira dos rios Tocantins e Itacaiúnas e hoje se vê “ponte entre o local e o global”, a COP30 deve gerar compromissos concretos, como o fim do marco temporal, a moratória da mineração em terras indígenas e o financiamento direto às comunidades via fundo de perdas e danos.

“Não somos vítimas, somos protagonistas. Organizem-se nas paróquias, escolas e universidades. Cobrem políticas públicas e levem suas histórias para Belém. A floresta vive em nós e nossa resistência é a semente do bem viver”, conclui.

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