Em edição especial do programa Missão COP30, transmitido pela Rádio Amar e Servir a partir do Centro de Mídia da conferência, o jornalista Ronnaldh Oliveira destacou a dimensão histórica do momento vivido em Belém. Segundo ele, a COP30 reúne cerca de 50 mil pessoas na capital paraense, num “grande movimento social e também um grande símbolo” de corresponsabilidade global.
O jesuíta Edmo, natural de Santo Antônio do Içá (AM), sublinhou o impacto de realizar a conferência no coração da floresta:
“Fazer uma atividade dessa no território amazônico sendo uma floresta, um bioma tropical e dar visibilidade ao território, sobretudo dar visibilidade às pessoas do território e também dar visibilidade aos valores e também da importância de preservar esse bioma (…) é necessário o cuidado com essa região, porque cuidar dessa região não é somente para as pessoas que vivem nela, mas é para o mundo todo também”.
Para ele, Belém “se torna a capital do Brasil oficialmente, também a capital do mundo nesses dias”, num tempo decisivo para dar visibilidade aos povos da floresta e aos valores do bem viver e da ecologia integral.
Democracia e justiça climática de mãos dadas
Convidado do programa, o antropólogo Leon Souza, mineiro nascido às margens do rio São Francisco e diretor da Casa Galiléia, lembrou sua trajetória nas pastorais sociais, na Cáritas e na Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM). Ele explicou que a Casa Galiléia atua com comunicação e campanhas para engajar católicos e evangélicos em dois eixos centrais: democracia e justiça climática.
Logo no início de sua participação, Leon resumiu a chave de leitura da instituição:
“Não dá para gente falar sobre democracia sem falar sobre justiça climática e não dá para gente falar sobre justiça climática sem linkar, sem pensar no fortalecimento dos processos democráticos nos nossos países”.
Segundo ele, a COP30 em Belém é o ápice de um longo processo que articula governos e sociedade civil desde conferências anteriores, como as realizadas no Egito, em Dubai e em Bacu. A realização da conferência em um país democrático, com forte presença da sociedade civil, é vista como um sinal de esperança e de possibilidade de maior ambição política nas negociações.
Fé, conversão ecológica e presença da Igreja na COP30
O jesuíta Edmo destacou que a presença recorde da Igreja Católica na COP30 – com bispos, cardeais, congregações e leigos engajados – está diretamente ligada ao legado magisterial sobre a ecologia integral:
“Na igreja foi um impacto grande por esse tema ecológico. De 800 anos a igreja vem falando disso, mas em muitos momentos silenciado. (…) Com Francisco, ele resgata isso nesse cuidado com a criação, cuidado com a casa comum, que todos somos irmãos”.
Ele recordou que, em Laudato Si’, o Papa chama à “conversão ecológica”, insistindo que não se trata apenas de uma mudança técnica ou de políticas públicas, mas de um processo espiritual e de transformação do cotidiano:
“Não podemos fazer uma conversão ecológica sem converter o nosso coração. (…) A mudança de hábito é importante nesse sentido. O cuidado com a criação entra novamente na igreja como propósito evangelizador. O compromisso com o cuidado da criação é compromisso de todo cristão”.
Edmo afirmou que, por isso, o tema ecológico “não pode mais dar um passo atrás” na vida da Igreja, porque cuidar da criação é parte da fidelidade ao Evangelho.
Desinformação climática e o desafio dentro das igrejas
Leon também abordou o problema da desinformação climática, que, segundo ele, não se resume a “fake news”, mas envolve uma produção intencional e em cadeia de mentiras sobre mudança do clima, com impactos diretos na opinião pública e nas decisões políticas.
Ele explicou que a Casa Galiléia integra a Rede de Parceiros pela Integridade da Informação sobre Mudança do Clima, uma iniciativa da UNESCO com mais de 100 organizações. O objetivo é enfrentar a distorção do debate, que muitas vezes usa inclusive uma linguagem religiosa para negar a crise climática:
Em suas palavras,
“Não basta só mais você desmentir, não é só isso é verdade ou isso é mentira. (…) A produção de desinformação sobre a mudança do clima dentro das igrejas católicas, evangélicas e de outras religiões tem aí uma pitada religiosa: ‘isso não tem nada a ver com igreja, não tem nada a ver com a nossa fé’, quando é muito pelo contrário”.
Leon lembrou que não existe comunidade de fé sem condições mínimas de vida, citando eventos extremos como enchentes, secas e tornados que já vêm destruindo casas e ceifando vidas. Para ele, fé e justiça climática “caminham juntas”, porque a ecologia integral é, em essência, “ciência de relações”.
Casa Galiléia: campanhas com católicos e evangélicos
Ao falar sobre o trabalho da Casa Galiléia, Leon destacou que a instituição nasceu em 2021 com a intenção de dialogar com um país majoritariamente cristão, sem negar a experiência de fé das comunidades.
Segundo ele, a casa atua com campanhas e comunicação estratégica, produzindo narrativas e movimentos que mobilizam católicos e evangélicos a partir da espiritualidade e de valores do Evangelho.
Ele citou duas iniciativas nas redes sociais:
“A gente tem duas campanhas incríveis. Uma chamada ‘Nossa Causa Comum’, (…) dedicada justamente a mobilizar católicos a partir dos ensinamentos do Papa Francisco sobre meio ambiente, sobre Laudato Si’, sobre ecologia integral. Uma outra é para mobilizar evangélicos, ‘Evangelho e Clima’. (…) O nosso grande desafio é construir outras palavras, outras coisas que mobilizam para além da catástrofe e da pedagogia do medo”.
Para o antropólogo, é preciso sair da lógica de que “não há mais tempo para nada” e, ao mesmo tempo, traduzir a urgência climática em esperança ativa e compromisso concreto.
Apelos aos negociadores da COP30
No encerramento do programa, Ronnaldh desafiou os convidados a dirigirem uma mensagem direta aos negociadores da COP30. Edmo pediu que as delegações escutem com seriedade quem já vive na linha de frente da justiça climática:
“Eu pediria aos participantes, às pessoas que vão decidir e que vão sair daqui inspiradas, que escutem os povos tradicionais do mundo, escutem as pessoas que já estão trabalhando com a justiça climática, que escutem as pessoas de boa vontade que se dedicam a cada dia a lutar por um mundo melhor, sobretudo para as futuras gerações. (…) Que não pensem somente no imediato, mas pensem também no mundo do futuro”.
Leon, por sua vez, lembrou que as decisões tomadas em Belém terão impacto direto na vida cotidiana de milhões de pessoas:
“Todos nós queremos viver. Para a gente viver, a gente precisa ter água, a gente precisa ter alimento e a gente precisa ter ar para respirar e ter casa para morar. (…) Quando a gente fala de mudança do clima, a gente não está falando de documentos que vão sair daqui, a gente está falando de decisões que têm impacto na vida cotidiana das pessoas”.
O programa terminou com o convite de Ronnaldh para que os ouvintes continuem acompanhando a COP30 pelos canais da Rádio Amar e Servir e rádios parceiras, sempre com “espiritualidade, formação, esperança e vida”.
English Translation
“Taking care of this region is not only for the people who live in it, but for the whole world as well”
On the program Missão COP30, Amazonian Jesuit Edmo and anthropologist Leon Souza, from Casa Galiléia, reflect on climate justice, democracy, faith, and the role of the Amazon in the conference’s negotiations in Belém.
In a special edition of Missão COP30, broadcast by Rádio Amar e Servir from the COP30 Media Center, journalist Ronnaldh Oliveira underlined the historic nature of the moment in Belém. He recalled that the conference brings around 50,000 people to the city in what he called “a major social movement and also a powerful symbol” of shared global responsibility.
Jesuit Edmo, born in Santo Antônio do Içá (AM), stressed the impact of holding the conference in the heart of the forest:
“Fazer uma atividade dessa no território amazônico (…) é necessário o cuidado com essa região, porque cuidar dessa região não é somente para as pessoas que vivem nela, mas é para o mundo todo também.”
“Holding an event like this in the Amazonian territory (…) makes it clear that caring for this region is not only for those who live there, but for the whole world as well.”
For him, Belém “becomes officially the capital of Brazil, and also the capital of the world these days”, at a decisive time to give visibility to forest peoples and to the values of buen vivir and integral ecology.
Democracy and climate justice go hand in hand
Guest Leon Souza, an anthropologist from Minas Gerais and director of Casa Galiléia, recalled his journey through Church social ministries, Cáritas and the Pan-Amazonian Ecclesial Network (REPAM). He explained that Casa Galiléia works with communication and campaigns to engage Catholics and evangelicals around two central pillars: democracy and climate justice.
Right at the beginning, he summed up the institution’s approach:
“Não dá para gente falar sobre democracia sem falar sobre justiça climática e não dá para gente falar sobre justiça climática sem (…) pensar no fortalecimento dos processos democráticos.”
“We cannot talk about democracy without talking about climate justice, and we cannot talk about climate justice without strengthening democratic processes.”
According to him, COP30 in Belém is the peak of a long process involving governments and civil society since previous conferences in Egypt, Dubai and Baku. Holding the event in a democratic country, with strong civil-society presence, is seen as a sign of hope and a chance for greater political ambition.
Faith, ecological conversion and the Church’s presence at COP30
Jesuit Edmo highlighted that the record Catholic presence at COP30 – with bishops, cardinals, congregations and lay groups – is directly linked to the Church’s magisterium on integral ecology.
He recalled that Pope Francis’ encyclical Laudato Si’ calls for “ecological conversion”, insisting that it is not only about technical measures, but about a spiritual process that transforms everyday life and habits. Ecological commitment, he stressed, is now part of the Church’s evangelizing mission and “cannot go back”.
Climate disinformation and the challenge inside churches
Leon also addressed the problem of climate disinformation, which he said is not just about “fake news”, but about an intentional and structured production of lies on climate change, with direct impact on public opinion and political decisions.
He noted that Casa Galiléia is part of a UNESCO-backed network on information integrity about climate change. According to him, disinformation within religious environments often uses theological language to deny the climate crisis, claiming that it “has nothing to do with faith”, when in fact faith and climate justice “walk together”.
He reminded listeners that there is no community of faith without basic living conditions, citing extreme events such as floods, droughts and tornadoes that destroy homes and claim lives.
Casa Galiléia: campaigns for Catholics and evangelicals
Speaking about Casa Galiléia, Leon said the organization was founded in 2021 to dialogue with a predominantly Christian country without denying people’s religious experience.
He highlighted two social-media campaigns: Nossa Causa Comum (“Our Common Cause”), aimed at mobilizing Catholics around Pope Francis’ teaching on ecology, and Evangelho e Clima (“Gospel and Climate”), directed at evangelical communities. The big challenge, he argued, is to “build other words” that mobilize people beyond fear-based narratives of catastrophe.
Appeals to COP30 negotiators
At the end of the program, Ronnaldh asked the guests to address a message directly to COP30 negotiators. Jesuit Edmo called on them to listen seriously to traditional peoples and those already working for climate justice, and to think not only of immediate interests but of future generations.
Leon stressed that the decisions taken in Belém will directly affect people’s daily lives, especially regarding access to clean water, healthy food and safe housing. Climate decisions, he said, are not just about documents, but about “sacred life” that must be protected.
The program closed with Ronnaldh’s invitation for listeners to continue following COP30 on Rádio Amar e Servir’s platforms and partner stations, “with spirituality, formation, hope and life.”