Teve início na manhã desta segunda-feira (10), em Belém, a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30). Pela primeira vez, a cúpula mundial do clima acontece na Amazônia, reunindo líderes globais, negociadores, cientistas, representantes da sociedade civil e povos tradicionais em um momento decisivo para o futuro do planeta.
A cerimônia de abertura foi marcada pelos mais diversos discursos como os do Secretário Executivo de Mudanças Climáticas da ONU, Simon Stiell, e o do presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, que deu as boas-vindas aos participantes e defendeu um novo pacto global de cooperação e solidariedade climática.
Em sua fala, Simon Stiell afirmou que o mundo vive hoje o futuro projetado dez anos atrás, quando foi assinado o Acordo de Paris, em 2015. Ele reconheceu avanços no combate às emissões, mas destacou que ainda há um longo caminho a percorrer. “Dez anos atrás, em Paris, estávamos projetando o futuro. Colegas, bem-vindos a esse futuro. A curva de emissões foi dobrada para baixo. Mas não estou adoçando: temos muito mais trabalho a fazer”, declarou Stiell.
O secretário ressaltou que a ciência é clara e que é possível — e necessário — reduzir as temperaturas de volta a 1,5 °C após qualquer ultrapassagem temporária. Ele também afirmou que o progresso não pode ser freado pela inação ou pelo pessimismo: “Lamentar não é uma estratégia. Precisamos de soluções.”
Stiell usou o Rio Amazonas como metáfora da cooperação internacional, lembrando que o sistema fluvial depende da força de inúmeros afluentes: “O Amazonas não é uma entidade única, mas um vasto sistema sustentado por mais de mil afluentes. Assim também deve ser o processo da COP — movido por múltiplos fluxos de colaboração entre nações.”
O dirigente destacou ainda que as energias renováveis ultrapassaram o carvão como principal fonte global e que os investimentos em energia limpa superam os combustíveis fósseis em 2 para 1. “Já concordamos que faremos a transição dos combustíveis fósseis. Agora é a hora de nos concentrarmos em como fazer isso de forma justa e ordenada”, disse Stiell.
Encerrando seu discurso, ele fez um apelo por união e coragem diante da crise climática: “Nesta arena da COP30, seu trabalho não é lutar uns contra os outros, mas lutar juntos contra essa crise. Paris está funcionando — mas devemos nos esforçar bravamente por mais.”
“A COP da Verdade”: o discurso de Lula e o protagonismo da Amazônia
Em seguida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu início oficial à conferência com um discurso de forte tom político e ético, marcado por referências históricas e pela reafirmação do papel do Brasil na liderança da agenda climática global. “Há mais de 30 anos, na Cúpula da Terra, o mundo se reuniu no Rio de Janeiro para debater o desenvolvimento e a proteção do meio ambiente. Hoje, a Convenção do Clima retorna à sua terra natal para recuperar o entusiasmo e o engajamento que embalaram seu nascimento”, disse Lula.
O presidente enfatizou que trazer a COP para o coração da Amazônia foi uma tarefa árdua, mas necessária, lembrando que a floresta é o lar de quase 50 milhões de pessoas e 400 povos indígenas distribuídos por nove países.
“Quem só vê a floresta de cima desconhece o que se passa à sua sombra. O bioma mais diverso da Terra é também um território de desafios sociais e econômicos que o Brasil enfrenta com determinação”, afirmou.
Segundo Lula, a realização da COP30 deixará legados concretos em Belém, com investimentos em infraestrutura e visibilidade global: “Quando vocês deixarem Belém, o povo da cidade permanecerá com os investimentos feitos para recebê-los. E o mundo poderá, enfim, dizer que conhece a realidade da Amazônia.”

10.11.2025 - Belém - O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva discursa na cerimônia de abertura da 30ª Conferência das Partes (COP30). Foto: Antonio Sciza/COP30
Cúpula de Belém e o Chamado à Ação
Lula apresentou os resultados da Cúpula de Belém pelo Clima, realizada nos dias que antecederam a COP30, destacando o lançamento do Fundo de Florestas Tropicais para Sempre, que arrecadou US$ 5,5 bilhões em um único dia.
Entre os compromissos adotados estão: manejo integrado do fogo; posse da terra para povos indígenas e comunidades tradicionais; quadruplicação da produção de combustíveis sustentáveis; criação de uma coalizão de mercados de carbono; combate à fome, à pobreza e ao racismo ambiental. Essas medidas integram o Chamado à Ação de Belém, documento que sintetiza as contribuições do Brasil para as negociações da COP30 e para o futuro da governança climática global.
“É momento de impor uma nova derrota aos negacionistas”
Em um dos momentos mais contundentes de seu discurso, Lula afirmou que esta será “a COP da Verdade”, diante da ameaça da desinformação e do negacionismo climático.
“Os obscurantistas rejeitam não só as evidências da ciência, mas também os progressos do multilateralismo. Eles controlam algoritmos, semeiam o ódio e espalham o medo. É momento de impor uma nova derrota aos negacionistas”, disse.
O presidente alertou que, embora o mundo esteja no caminho certo desde o Acordo de Paris, o ritmo ainda é insuficiente para conter o aquecimento global: “Estamos andando na direção certa, mas na velocidade errada. Romper a barreira de 1,5 °C é um risco que não podemos correr.”
Três eixos para o futuro climático
O Chamado à Ação de Belém apresentado por Lula está dividido em três eixos principais:
1. Cumprir compromissos climáticos: fortalecer as Contribuições Nacionalmente Determinada (NDCs), garantir financiamento, transferência de tecnologia e atenção à adaptação;
2. Acelerar a ação climática: construir um mapa global para superar a dependência dos combustíveis fósseis e combater o desmatamento. Lula propôs a criação de um Conselho do Clima vinculado à ONU, para dar mais força política à agenda ambiental;
3. Colocar as pessoas no centro: reconhecer que a crise climática é também uma crise de desigualdade, com impactos desproporcionais sobre mulheres, afrodescendentes, migrantes e povos indígenas.
“A emergência climática aprofunda a lógica perversa que define quem é digno de viver e quem deve morrer. Mudar pela escolha nos dá a chance de um futuro que não é ditado pela tragédia”, afirmou Lula.
“Que a serenidade da floresta nos inspire”
Encerrando o discurso, o presidente citou o xamã ianomâmi Davi Kopenawa, convidando os líderes a encontrarem na Amazônia a inspiração e a clareza necessárias para agir:
“O pensamento na cidade é obscuro e esfumaçado, obstruído pelo ronco dos carros e pelo ruído das máquinas. Espero que a serenidade da floresta inspire em todos nós a clareza de pensamento necessária para ver o que precisa ser feito.”
Um marco histórico para a Amazônia e para o mundo
A abertura da COP30 em Belém consolidou o encontro entre diplomacia, ciência e justiça climática. Nas palavras de Simon Stiell e Lula, a conferência marca um ponto de virada — um chamado à ação coletiva, justa e corajosa, nascida do coração da floresta amazônica.
Belém se torna, por duas semanas, a capital mundial do clima — e o símbolo de uma nova era de cooperação em defesa da Casa Comum.