Organizar a esperança é parte essencial da missão cristã e, em 2025, ano do Jubileu da Esperança, esse compromisso se torna ainda mais urgente diante da crise climática. Foi com esse horizonte que o pavilhão da Organização de Estados Ibero-americanos (OEI), na Zona Verde da COP30, sediou na terça-feira, 18 de novembro, um painel dedicado à pergunta central: “Estamos fazendo o suficiente para avançar no cuidado da Casa Comum?”
A atividade reuniu representantes de diversos setores: Kalil Cury Filho (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo — FIESP), Hernán Coronado (Organização Internacional do Trabalho — OIT), Kaira Reece (União de Trabalhadores das Américas), Patricia Gualinga (Conferência Eclesial da Amazônia — CEAMA) e dom Reginaldo Andrietta (Conselho Episcopal Latino-Americano — CELAM / Rede Eclesial para o Trabalho e a Oficina — RETO). A mediação foi feita pelo padre Anderson Pedroso, SJ (Companhia de Jesus), reitor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e presidente da Organização de Universidades Católicas da América Latina e Caribe (ODUCAL), cuja presença integra a atuação articulada da Companhia de Jesus na COP30.

Uma ponte entre Jubileu e COP30
Ao abrir o diálogo, padre Anderson destacou que o encontro representa “mais um passo na construção de uma ponte entre o Jubileu e a COP30”, afirmando que o cuidado da Casa Comum exige o mesmo espírito de corresponsabilidade próprio do Ano Santo.
A reflexão aprofundou a importância das redes como instrumento transformador. Para Kaira Reece, “o trabalho em rede é fundamental”, sobretudo para que sindicatos e trabalhadores tenham voz na transição energética, uma mudança que impacta diretamente quem vive em maior vulnerabilidade, muitas vezes em condições laborais precárias.
Trabalho coletivo e governança inclusiva
O compromisso compartilhado é também o caminho para soluções climáticas, afirmou Kalil Cury Filho. Ele reforçou o papel das atitudes individuais e das iniciativas já em curso na economia circular, lembrando que a agenda climática é, ao mesmo tempo, tecnológica, humana e política.
Para Hernán Coronado, construir uma governança climática verdadeira exige representatividade ampla, com centralidade para povos indígenas, comunidades locais e juventudes. “A transição precisa ocorrer com respeito, melhores condições de vida e garantia de direitos”, afirmou.
CEAMA: o clamor do território amazônico
A voz amazônica veio com força por meio de Patricia Gualinga, vice-presidenta da Conferência Eclesial da Amazônia (CEAMA), que reforçou que a conferência nasce “de um clamor e de um território”. Pela primeira vez em uma COP, a CEAMA leva a realidade amazônica e suas urgências, com destaque para a demarcação de territórios e a presença dos povos indígenas em espaços de decisão.
Ela lembrou que os territórios indígenas são os mais preservados e que a falta de financiamento compromete sua defesa. Por isso, pediu reconhecimento dos saberes ancestrais como conhecimento científico, fundamentais para enfrentar a crise climática.
Ecologia integral: horizonte da Igreja latino-americana
Dom Reginaldo Andrietta situou o debate no contexto do pensamento social da Igreja. Segundo ele, o Acordo de Paris gera avanços reais, mas ainda insuficientes, devido às resistências das grandes potências. Na América Latina, a ecologia integral não é novidade: atravessa décadas de Magistério, desde Paulo VI até os escritos dos papas contemporâneos.
O bispo ressaltou que Papa Francisco e o atual pontífice, Leão XIV, têm colocado o trabalho no centro de suas reflexões. Citando a encíclica Dilexi te, lembrou o alerta contra “a ditadura de uma economia que mata”, reforçando o apoio da Igreja a movimentos populares e a importância da democracia nas negociações climáticas.
Dignificar a vida: um chamado comum
Ao final do encontro, os participantes convergiram na urgência de dignificar a vida como eixo de qualquer decisão climática.
Kalil Cury Filho destacou o valor da Laudato Si’, sobretudo no reconhecimento do trabalho como elemento que dá sentido à existência humana. No mesmo horizonte, Kaira Reece insistiu que o desenvolvimento sustentável deve sempre priorizar a vida e a dignidade das pessoas.
Hernán Coronado reforçou o papel das comunidades indígenas e locais na formulação das soluções. Gualinga, por sua vez, questionou a inclusividade da COP e defendeu o resgate da Laudato Si’, que uniu saberes científicos e ancestrais. Para dom Andrietta, esse diálogo socioambiental é o espírito necessário para alcançar metas comuns.